Dúvidas Saudáveis
Nos anos de 1.984 e 1.985, enquanto frequentava o Instituto de Física, tive a oportunidade de conhecer um grande mestre, um dos poucos que restam na universidade. Ouvira falar de sua habilidade e competência – por isso me matriculei em sua matéria optativa assim que minha grade horária permitiu.
Ele lecionava somente uma matéria por semestre no curso de graduação – o foco de seu trabalho estava na orientação de mestrandos e doutorandos. No início, eu não tinha ideia do que seria abordado naquela disciplina (cujo nome era bastante complexo: “Sínteses e Aplicações de Processadores Digitais”).
Interessava-me conhecê-lo. Pela estrutura curricular, ao nos matricularmos em uma cadeira eletiva, automaticamente ela se torna obrigatória em nosso histórico escolar. Graças a isso, tive que cursá-la uma segunda vez, pois fora reprovado por faltas na primeira ocasião.
Isso me proporcionou a oportunidade de assistir pela segunda vez à aula de apresentação do curso do semestre. Acredito que, somente então, tenha notado a grande importância daquele primeiro encontro.
Depois de apresentar o programa do semestre, critérios de avaliação e dinâmica do curso, num dado momento parava, olhava para cada um de nós e dizia, bem pausadamente: “Nós, da comunidade científica, que acreditamos que o homem pisou a Lua…”.
Mais uma vez, durante um longo silêncio, dirigia seu olhar atento por cada um de nós, alunos, e, ao ter olhado para todos, quebrava o silêncio: “Sim, pessoal… Eu digo isso, `nós, da comunidade científica, que acreditamos que o homem pisou a Lua…’, porque até hoje eu não consegui convencer a minha tia de que o homem realmente realizou essa conquista”.
Sua frustração era evidente. Entretanto, sua serenidade, muito presente. Era um doutor em ciências da informação, um cientista extremamente gabaritado, membro da comunidade acadêmica internacional e tinha trânsito livre em qualquer universidade do planeta e acesso às mais diversas publicações científicas e materiais didáticos…
Toda essa variedade de fontes não fora suficiente para convencer sua própria tia. Certa vez, levara um filme para mostrar-lhe. Ela assistira ao filme com atenção e, quando questionada sobre sua opinião, respondeu: “Ah, esses meninos de Hollywood… O que eles não são capazes de fazer para nos fazer acreditar nesse mundo de fantasias!”.
Fotos, filmes, reportagens… Nada era suficiente para persuadi-la. Tal sofrimento e frustração de falhar em convencer a tia e o conflito de viver debaixo do mesmo teto com uma pessoa incrédula na ciência, o objeto de seu amor e sua devoção, provavelmente o conduziram à mais importante conclusão de qualquer cientista: tomou consciência de que ele escolhera acreditar nesta história – ele mesmo não estivera na Lua, nem sequer na cápsula espacial que alunissara, através da qual, pela escotilha, pudesse observar o primeiro homem pisando a Lua!
Chegara, enfim, à conclusão de que ele escolhera acreditar nessa história e se utilizar pessoal e profissionalmente de tal conhecimento. Mas não pudera testar, através de sua percepção, a realidade absoluta de tal fato, conforme reza o pensamento científico.
Tanto quanto esse meu mestre, eu nunca estive na Lua, nem na cápsula espacial. No entanto, graças a ele hoje também sei que eu decidi acreditar nisso. Acolher tal fato como verdade ou não foi apenas uma questão de escolha. Escolhi, portanto, compartilhar de sua crença.
Essa postura de dúvida eterna em relação às experiências não vivenciadas pode ser bastante saudável para conter uma tendência humana de “estar certo”! Sou extremamente dedicado e comprometido com o trabalho que realizo e as técnicas educacionais que utilizo. Entretanto, se você me encontrar um dia, no futuro, em qualquer lugar deste planeta, ou mesmo fora dele (afinal de contas, as viagens espaciais estão cada vez mais próximas), e me perguntar: “Walther, li um de seus livros (ou frequentei o seu seminário) e encontrei coisas interessantes nele… Diga-me uma coisa, aquilo que você disse no livro (ou curso) é realmente verdade?”. Eu nego! Em qualquer lugar do Sistema Solar ou fora dele! O que vou dizer é que tudo aquilo que faço ou fazia, ensino ou ensinava, é ou era o que eu conhecia de mais próximo da verdade até então.
Porém, se posteriormente, em direção ao futuro, eu aprender novos métodos e ferramentas mais rápidas, mais potentes e mais naturais em resultados, eu não tenho escrúpulo nenhum em abandonar tudo o que já aprendi e estudei, pois o meu compromisso visceral é resultados palpáveis, e não com modelos teóricos ou científicos. Nós somos herdeiros de uma ignorância crônica no universo humano, apenas somos capazes de elaborar precários modelos de conhecimento da realidade: vivemos num mundo de fantasias!
Portanto, faço um convite a que você, leitor, experimente a mesma atitude para estar mais aberto às mudanças e aprendizados da vida: não acredite em nada do que ouvir ou ler, a não ser que você consiga comprovar através de sua própria percepção, razão ou intuição. E ainda assim, saiba que, um dia, talvez tudo isso venha a mudar. Em especial, tenha sempre em mente que quando uma pessoa lhe disser que algo não tem solução ou cura, ela está apenas compartilhando a sua ignorância! Grande parte das doenças incuráveis atualmente, são assim apenas porque você ainda não encontrou alguém que tenha a solução.